Artigo: Quem organiza o maior Carnaval do planeta precisa tratar a população de forma digna
Uma cidade para turista. Essa é Salvador, cidade com maior contingente negro fora do continente africano. De riqueza cultural incontestável. Produtora da maior festa popular de rua do mundo, mas que, contraditoriamente, passa longe no quesito valorização da sua gente e, para contextualizar esse fato, temos a situação caótica enfrentada por ambulantes que, em paralelo às belíssimas imagens de praias lotadas da alta estação, são submetidos ao protagonismo da humilhante e inóspita moradia embaixo de viadutos nos arredores da secretaria responsável pela concessão do licenciamento para trabalhar nas festas populares. Um problema amplamente denunciado pelos meios de comunicação e sociedade, mas que se arrasta por décadas nessa cidade de todos os pobres.
O motivo? Nada técnico. Falta mesmo vontade política para solucionar a questão enfrentada majoritariamente por mulheres negras arrimo de família. É só observar as justificativas dadas pelos gestores que, quando cobrados sobre o tema respondem que “a pressão não vai funcionar” e “acham difícil alguém hoje em dia não ter um celular”, como se fosse uma escolha simples famílias inteiras passarem uma temporada dormindo embaixo de viadutos, e desconsiderando a desigual realidade digital na capital baiana.
Enquanto o povo passa ao vivo e a cores pela vergonhosa situação de descaso e vulnerabilidade, a administração municipal fecha contratos milionários com cervejarias, se dedica a organizar grandes festivais, cria modais de transportes especiais que, inclusive, contemplam até estacionamento e aguarda a movimentação econômica em torno de R$ 1,8 bilhão na cidade. Tudo isso às custas de quem prepara o acarajé, carrega as malas, compõe as músicas, cria o gênero típico musical, é o principal cartão postal e a “Alegria da Cidade”: o povo preto, pobre e periférico de Salvador.
Interessante, ainda, no Novembro Negro, a Prefeitura intitular “Salvador 22222 Capital Afro. Onde Pulsa Salvador, desperta África”. A julgar pela fila indigna da Semop está mais para capital da afroconveniência.
É preciso dar um basta. Quem organiza o maior Carnaval do planeta precisa saber oferecer tratamento digno às pessoas.
Resistiremos à reedição do “desafricanizar as ruas” já tentado no início do século XX!
*Vereador Sílvio Humberto (PSB)