Política

Assembleia comemora os três anos da Frente Nacional Makota Valdina

Invocando a proteção dos orixás, ogans, ekedis, babalorixás e ialorixás, dirigentes de terreiros e representantes de entidades ligadas ao Candomblé celebraram ontem (31), na Assembleia Legislativa da Bahia, os três anos da Frente Nacional Makota Valdina- pela preservação e defesa dos espaços identitários das religiões de matriz africana. A homenagem para a educadora, um símbolo de luta e resistência para o povo de santo, foi realizada durante audiência pública, na Sala Deputado José Amando, promovida pela Comissão Especial da Promoção da Igualdade. A presidente do colegiado, deputada Fátima Nunes Lula (PT), lembrou que Valdina de Oliveira Pinto, que faleceu em março de 2019, aos 76 anos, foi uma grande mulher, uma ativista que sempre defendeu os direitos do povo negro.
 
A petista salientou que a Casa das Leis comemora a vida e o legado da sacerdotisa, ao lado de tantas amigas e companheiras da religião, tendo essa busca constante de combate ao racismo e ódio que ainda existe no Brasil. Segundo a parlamentar, é preciso recontar a história de Makota Valdina nas salas de aula e em todos os espaços. “Nós temos que pegar as leis que já foram aprovadas aqui na ALBA e tornar, nas escolas e nos ambientes de trabalho, uma vivência concreta, porque lei na gaveta não resolve nada. A gente precisa de mudança de atitudes e comportamentos”, garantiu.
 
TRAJETÓRIA
 
Considerada um dos maiores expoentes da Cultura Negra da Bahia e do Brasil, a soteropolitana Makota Valdina nasceu em 15 de outubro de 1943. Professora da rede municipal de ensino, ela passou a ser conhecida como Makota em razão do cargo recebido no Terreiro Angola Tanusi Junsara, no bairro do Engenho Velho da Federação. Para muitos dos seus seguidores, foi uma mulher que esteve à frente de seu tempo. Em 2013, quando lançou o livro “Meu Caminho, Meu Viver”, a pedagoga escreveu: “A história de vida de cada negro é parte de uma história coletiva que ainda está por ser verdadeiramente conhecida por muitos”.
 
Mãe Jacira de Santana Miranda, presidente da Rede Religiosa de Matriz Africana do Subúrbio, (RREMAS) definiu Makota Valdina como “uma mulher pequena no tamanho, mas de grande sabedoria no pensar”. A ialorixá do Ilê Axé Ibá Lugan, no subúrbio de Salvador, ressaltou que a religiosa, com sua liderança, jamais deixou de fazer a defesa dos povos de matriz africana: “Se agora estamos aqui é porque ela deixou um legado tão positivo que vai ficar pra vida toda. Onde ela estiver será sempre lembrada por todos nós”.
 
COLETIVO
 
Presidente do Conselho Municipal de Políticas Culturais de Salvador, Iyá Márcia de Ogum explicou que a Frente Nacional Makota Valdina é um coletivo de luta e de resistência que começa justamente por causa da onda, da cultura de ódio que se instalou na sociedade brasileira, “onde o povo preto é perseguido pela cor da sua pele, pela religião, pela fé que professa”. A gestora frisa que a frente surgiu com a intenção de dizer ao público em geral que o povo preto está cansado, que o povo preto tem mais de 80% de colaboração na cultura desse país. “Meus ancestrais, príncipes, princesas, reis e rainhas, foram arrancados da África e vieram para cá construir esse país, que não reconhece o valor do povo preto”, discursou. Márcia de Ogum entende que Salvador, a Bahia e o Brasil podem viver com a diversidade e essa audiência serve para “dizer não aos pastores intolerantes que agridem o Candomblé e vão para a Pedra de Xangô colocar uma quantidade absurda de sal grosso, achando que vai anular a força do orixá com este tipo de atitude, que só prejudica a natureza, pois corrói a pedra”, enfatizou.  
 
Representante do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), Welton Luiz Costa reconheceu que a comunidade negra é organizada e resistente, merecendo o respeito de todos, “por ser responsável pela maior parte de nossa cultura afro-brasileira”. Ele agradeceu aos povos tradicionais pelo trabalho de preservação dessa cultura e colocou à disposição o órgão ambiental, em nome da diretora geral Daniela Fernandes.
 
Babá Washington Dias, da Frente Nacional Makota Valdina, considera importante que esse coletivo possa celebrar, a cada mês, a cada ano, essa luta muito específica contra o ódio e o racismo religioso. Para ele, o próprio racismo se encarrega de apagar e de matar todas e quaisquer iniciativas de luta e organização do povo negro. Washington destacou ainda como Makota Valdina cunhou o termo Ebó Coletivo, dizendo que nada mais é do que esse atrevimento, essa convocação da nossa ancestralidade, transformar esse cuidado em luta política. “É a expressão de unidade nessa pluralidade, enquanto nações de povos africanos, enquanto nações de candomblé, enquanto pessoas de orientações ideológicas e sexuais diferentes. Queremos respeito, estamos dizendo que nossos valores precisam ser incorporados”, pontuou.
 
LEGALIZAÇÃO
 
“Menos ódio e mais respeito”, pediu a Iyá Vilma de Odé, fundadora da Associação Luz da Vida. De acordo com ela, se Makota Valdina estivesse viva estaria denunciando essa intolerância, fazendo o enfrentamento dessas agressões, enfim, defendendo a juventude preta e pobre que vem sendo assassinada nas periferias por conta do racismo institucional. Acrescentou que vai continuar na luta para que a verdadeira história da religião possa ser ensinada nas escolas públicas e conclamou a todos os adeptos do povo de santo a batalhar pela legalização dos terreiros. “O povo de terreiro não conhece os seus direitos, um deles é de que podemos registrar o espaço como associação e usufruir dos benefícios da legislação”, concluiu.
 
Alan Oliveira, ogan e comunicador do Programa Voz do Axé, recordou a participação de Makota Valdina na luta contra o BRT de Salvador, denunciando ainda que 367 árvores foram arrancadas para a instalação do sistema de transporte e jamais foram replantadas.
 
Participaram da audiência pública as seguintes personalidades: Maíra Vida, do Centro de Combate à Intolerância Religiosa Nelson Mandela, da Sepromi; Lindinalva de Paula, vice-presidente do Conselho de Desenvolvimento da Comunidade Negra (CDCN); Mira Alves, Coletivo Incomode; Aline Jesus e Eduardo Machado, Frente Nacional Makota Valdina; Christina Rodrigues, assessora da deputada Fabíola Mansur (PSB); Patrícia Teles, assessora da deputada Olívia Santana (PCdoB); Andrea Luiza, assessora do deputado Jurailton Santos (Republicanos) e Diógenes Matos, assessor do deputado Bira Corôa (PT).
 
Os versos da poeta Maiara Silva, também presente no encontro, comprovam que manifestação de orixás “não é macumba, pois o Candomblé é religião de gente decente e nosso povo é forte e consciente”. A deputada Fátima Nunes encerrou a reunião manifestando o pensamento de Makota Valdina: “É preciso ser sujeito dessa história e não objeto. Eu não quero que me tolerem. Eu quero que me respeitem o direito de ter a minha crença”.
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