Política

Ano no Ministério da Justiça e Segurança é marcado por crise política e aumento da violência

O ano no Ministério da Justiça e Segurança Pública e no Palácio do Planalto foi marcado por novo vaivém de portarias que diminuem o controle de armas, recorde na concessão de registros delas, aumento dos crimes violentos, crise política e paralisação de programas como o Em Frente Brasil.

No fim de abril, a pasta protagonizou uma conturbada troca de titular. O então ministro, Sergio Moro, pediu demissão, denunciando interferências políticas do presidente na Polícia Federal. Como ex-juiz da Lava Jato em Curitiba, era considerado um símbolo do combate à corrupção e emprestava esse perfil ao governo de Jair Bolsonaro (sem partido).

Quem assumiu foi André Mendonça, doutor em direito e pastor, que ocupava o cargo de advogado-geral da União. Como servidor público, ele havia atuado na recuperação de recursos desviados em casos de corrupção.

Mendonça é um dos nomes cogitados por Bolsonaro para assumir uma vaga no STF (Supremo Tribunal Federal), já que se encaixaria no critério de “terrivelmente evangélico”, característica mencionada por Bolsonaro para um possível próximo indicado. Ele tomou posse prestando continência ao presidente, que chamou de profeta.

No início do ano, Moro comemorava a queda de homicídios que acontecia desde 2018 e se manteve até o fim de 2019, índice divulgado como fruto do sucesso do governo na área. No entanto, em fevereiro, uma crise se instalou com a greve de policiais militares do Ceará, e os crimes violentos começaram a crescer.

No primeiro semestre de 2020, o país registrou 7% de aumento nos assassinatos —25.712 pessoas foram mortas, o equivalente uma a cada dez minutos. Os dados são do Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

As mortes pela polícia e dos próprios agentes de segurança também cresceram. Já os registros de roubo caíram, o que pode ser explicado pela queda nos registros, com delegacias fechadas durante a pandemia, e pelas medidas de isolamento, que tirou gente das ruas, di minuindo assim os roubos de transeuntes ou de veículos.

Diminuíram também os registros de violência sexual e doméstica, mas não caíram as mortes de mulheres.

O anuário mostrou que o número de registros de armas de fogo para colecionadores, atiradores e caçadores mais que dobrou neste ano. Na comparação com 2019, houve aumento de 120%. Cresceu também o total de armas compradas por cidadãos comuns e pelas forças de segurança —66%, entre 2017 e 2019. São mais de 2,1 milhões de registros ativos no país. ​

Os dados mostram que 72,5% dos assassinatos no país são cometidos por armas de fogo e que jovens e negros são as principais vítimas.

O novo ministro tem investido em mais armamento para ser distribuído às secretarias de segurança pública estaduais. Em 2020, a pasta gastou mais de R$ 10 milhões na compra de equipamentos. Do montante, R$ 9,7 milhões foram usados para a compra de 1.660 carabinas. Segundo a pasta, também foram entregues capacetes e coletes balísticos.

Já o principal programa de prevenção e repressão à criminalidade do ministério, o Em Frente, Brasil, está paralisado. Criado por Moro, ele não foi expandido para além das cinco cidades da primeira fase, Goiânia (GO), Ananindeua (PA), Cariacica (ES), Paulista (PE) e São José dos Pinhais (PR), onde caíram os roubos e homicídios. Mendonça criou em setembro um comitê para avaliar, em um ano, se irá continuar ou não com o projeto-piloto.

Outra medida que gerou polêmica foi a criação de um protocolo para investigação de feminicídios, que não é transparente. O ministério disse apenas que o documento determina a instauração imediata de inquérito policial nos casos de morte violenta de mulheres e dá prioridade na realização de exames periciais.

Já os cursos a distância disponibilizados pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) para agentes de segurança de todo o país, ainda mais importantes em contexto de distanciamento social, foram reduzidos de 72 em 2018 para 43 em 2020.

O ministro costuma exaltar a atuação da Polícia Federal em operações para desarticular financeiramente organizações criminosas, principalmente do tráfico de drogas, e nas fronteiras. De maio a setembro de 2020, houve recorde na apreensão de bens do crime, segundo a pasta —em 2019, foram apreendidos R$ 1 bilhão e, em 2020, R$ 2,1 bilhões. O número de operações, no entanto, pouco mudou de 2018 pra cá.

O MJ também comemorou o que chamou de “maior apreensão de drogas da história do país”. Em ação do Programa Vigia, do governo federal com policiais do Mato Grosso do Sul, foram apreendidas 33 toneladas de maconha em Maracaju. O prejuízo aos criminosos foi de cerca de R$ 55 milhões.

Também foi preso um dos líderes do PCC (Primeiro Comando da Capital), que estava foragido há 21 anos. Gilberto Aparecido dos Santos, o Fuminho, foi encontrado em abril em Moçambique, após investigação da Polícia Federal com cooperação internacional.

“O governo do presidente Bolsonaro veio com uma missão: erradicar a criminalidade organizada em nosso país”, afirmou o ministro em rede social.

Por outro lado, a Operação Lava Jato, também da PF, vem sendo esvaziada; segundo o presidente, porque não existe corrupção em seu governo.

Ainda na gestão Moro, com o crescimento dos casos de Covid-19 dentro dos presídios, o Depen (Departamento Penitenciário Nacional) chegou a propor isolar presos idosos e doentes em contêineres, mas acabou recuando.

Segundo o órgão, até quinta-feira (5), foram detectados pouco mais de 32 mil casos de coronavírus entre os presos e 122 morreram. Há ainda 7.297 casos suspeitos e uma provável subnotificação, já que o número de testes aplicados corresponde a só 6% do total de detentos. O Brasil é o segundo país com mais casos e óbitos por coronavírus, atrás apenas dos EUA.

Entre março e abril, o Exército publicou três portarias de modernização da gestão de produtos controlados incluindo armas, munições e explosivos. As medidas atendiam a recomendações do Ministério Público Federal e do Tribunal de Contas da União, que haviam documentado fragilidades nos sistemas.

O texto obrigava lojistas e fabricantes a integrarem seus bancos de dados com o do Exército, para melhorar a rastreabilidade dos itens.

Mas as medidas não chegaram a ficar nem 24 horas em vigor, porque Bolsonaro determinou a revogação sem dar uma justificativa técnica, fazendo referência apenas a solicitações recebidas de grupos de proprietários de armas.

O Exército deu quatro versões diferentes para tentar explicar a revogação e, na prática, o Brasil está há seis meses sem regras de marcação de armas e munições e sem sistema nacional de rastreamento.

Ainda em abril, o governo federal publicou outra portaria aumentando a quantidade de munições autorizadas para compra para defesa pessoal —triplicando de 200 para 600 o limite de compra de cartuchos para quem tem arma registrada. A nova regra foi suspensa por decisão judicial.

Existem sete ações no STF e ao menos quatro na Justiça Federal pedindo anulação dos decretos e portarias de armas, segundo o Instituto Sou da Paz.

O MPF (Ministério Público Federal) abriu investigação para cobrar esclarecimentos do governo federal, que está agora sob suspeita de interferir em atos de exclusividade do Exército. Também há ao menos 73 projetos de decreto legislativo (PDL) no Congresso Nacional propondo a invalidação das medidas do presidente.

Já em maio, sob administração de Mendonça, foi revogada a portaria que previa acionamento de forças policiais para cumprimento de medidas de controle da pandemia. Ele alegou primazia das liberdades individuais.

A pasta também recebeu recursos de créditos extraordinários para utilizar em ações de enfrentamento da pandemia, mas, até julho, apenas 47% tinha sido empenhado, segundo o Sou da Paz. Para ações de combate à criminalidade, a porcentagem foi ainda menor: apenas 14%.

Outro lado
Em nota, o Ministério da Justiça e Segurança Pública afirmou que tem priorizado a segurança pública e se reaproximado das secretarias estaduais de Segurança “para uma atuação coordenada, sistêmica, integrada e cooperativa no combate à criminalidade, conforme determina a Lei do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP)”.

O foco, segundo a pasta, são tráfico de drogas, descapitalização de organizações criminosas, combate à corrupção, abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes, lavagem de dinheiro, além de desvio de materiais e verbas da saúde.

Outra aposta foi a criação da Secretaria Nacional de Gestão e Ensino em Segurança Pública (Segen), com 57 cursos de ensino, pesquisa e capacitação para os profissionais da área. Até agora, foram 137 mil matrículas na rede de ensino a distância, segundo o MJ.

A pasta também argumenta que alguns crimes caíram no primeiro semestre de 2020, de acordo com o sistema do governo federal, como lesão corporal seguida de morte (-15%), tentativa de homicídio (-8%) e o latrocínio (-18%).

Sobre o Em Frente, Brasil, o ministério afirmou que o projeto “encontra-se em fase de avaliação para estruturação do Programa Nacional de Enfrentamento à Criminalidade Violenta e consequente expansão para outros municípios”.

Também informou que irá realizar este ano o maior repasse de recursos para os estados investirem em segurança pública “da história do país”, no valor de R$ 1,2 bilhão.

Desse total, R$ 502 milhões já foram repassados em junho e R$ 755 milhões serão repassados, via Fundo Nacional de Segurança Pública, até o fim do ano.

Fonte:BNews

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