Política

Poder Legislativo debate em Audiência Pública o Novembro Negro, todas as vozes contra o racismo

As marchas e caminhadas organizadas pelos movimentos sociais durante este mês em Salvador, a necessidade de um diálogo cada vez maior com a sociedade e a campanha de combate ao racismo estrutural e institucional dominaram os trabalhos da audiência pública “Novembro Negro: Todas as Vozes Contra o Racismo”. O evento, promovido pela Comissão Especial da Promoção da Igualdade da Assembleia Legislativa, em parceria com a Secretaria Estadual da Promoção da Igualdade (Sepromi), reuniu, no Auditório Jornalista Jorge Calmon, parlamentares, autoridades, lideranças de entidades negras e representantes do povo de matriz africana.
 
“Não basta ter na gaveta a lei contra o racismo. Ela precisa ser internalizada por toda a sociedade e também pelas esferas governamentais. Com políticas públicas de transformação, podemos desenvolver a cultura da paz”, assim pensa a presidente do colegiado, deputada Fátima Nunes. A petista lembrou da luta de Dandara, Zumbi dos Palmares e de tantos outros mártires que se rebelaram em prol da “construção de um mundo melhor para o povo negro”. Ela afirmou que a audiência tem a marca da dignidade, do combate ao racismo e de qualquer tipo de intolerância e discriminação racial. Segundo a deputada, “é só olhar para as estatísticas das taxas de homicídios e analfabetismo, com relação aos negros, que fica evidente o tamanho das desigualdades sociais”, completou.
 
A titular da Sepromi, Fabya Reis, conclamou toda a sociedade e as instituições para que se envolvam nesta campanha “levantando a sua voz para combater o racismo”. Ao mesmo tempo, acrescenta Fabya, é importante que aquelas pessoas que insistem na conduta do crime de racismo sejam responsabilizadas. A Lei Caó, que está completando 30 anos, torna o crime de racismo inafiançável e imprescritível. Sancionada pelo então presidente da República José Sarney, foi proposta pelo baiano Carlos Alberto Oliveira, eleito deputado federal pelo Rio de Janeiro. A gestora da Secretaria Estadual da Promoção da Igualdade observa que em um estado como a Bahia, que tem 82% da população de negros e negras, “precisamos ter a capacidade de promover a igualdade racial e marcar presença em todos os espaços possíveis, como universidades, câmaras e assembleias”.
 
REPARAÇÃO
 
A audiência pública Novembro Negro atraiu a atenção de muitos parlamentares. A deputada Maria del Carmen (PT) disse que este é um momento de debates sobre as leis contra o racismo, uma oportunidade para que todos possam relembrar os movimentos que aconteceram ao longo da história. A parlamentar reafirma “a importância de se encarar esse processo com clareza e firmeza, defendendo ainda que o Governo Federal precisa reparar os erros do passado”. Já o deputado Jurailton Santos (Republicanos), vice-presidente da Comissão da Promoção da Igualdade, ressaltou que “sentiu na pele a discriminação racial em boa parte da vida”. Ele garantiu que deixou de olhar as críticas e seguiu adiante “com a força do amor”. Aos jovens estudantes do Colégio Estadual Mestre Moa do Katendê, que assistiam à reunião, Jurailton recomendou que buscassem sempre a valorização como pessoa, investindo na capacitação. 
 
Deputados que integram outros colegiados da Casa Legislativa também prestigiaram o evento. A deputada Neusa Cadore (PT), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Segurança Pública, preferiu falar sobre a desigualdade social que prejudica a comunidade negra das periferias, do encarceramento da juventude negra e da mulher que é vítima do feminicídio e dos baixos salários. Cadore reiterou que todas as pessoas que bradam contra o racismo “são sementes que brotam na construção de um caminho com mais justiça para essa população escravizada por tantos séculos no Brasil”.
 
Fabíola Mansur (PSB), deputada que preside a Comissão de Educação e Cultura, também se pronunciou sobre a questão, assegurando que “aqui no Parlamento baiano tem vários deputados que levantam suas vozes o ano inteiro contra o racismo”. A socialista entende que é preciso combater o racismo para gerar mais educação, emprego e visibilidade dos direitos. Mansur deu total apoio à campanha do Governo do Estado, que recebeu algumas críticas pelo conteúdo forte. “A campanha não é agressiva, agressivo é o racismo que mata, nos choca ver a perda de vidas humanas nas periferias”. 
 
O ex-deputado estadual e ex-presidente do colegiado na legislatura anterior, Bira Corôa, não se esqueceu de reverenciar a memória de Zumbi e Dandara, além de ressaltar a Revolta dos Búzios, que há 220 anos foi um marco da resistência de homens que foram enforcados e esquartejados pelos senhores do poder colonial da época. Atualmente exercendo o cargo de superintendente Parlamentar da ALBA, Bira Corôa elogiou a Lei 13.182/2014, que criou o Estatuto da Igualdade Racial e de Combate à Intolerância Religiosa do Estado da Bahia.
 
O desembargador do Tribunal de Justiça da Bahia, Lidivaldo Britto, fez uma longa explanação sobre o tratamento que foi dado à legislação a respeito do tema desde o início do século XIX. Ele mencionou o princípio da separação entre as raças, passou pelo “embranquecimento do país”, discorreu sobre a Convenção Internacional da Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial e finalizou com as Políticas Afirmativas, a Constituição Federal de 1988 e a Lei Caó. O defensor público Lucas Marques foi enfático. “A escravidão promoveu condições desumanas nas senzalas, as mulheres negras eram exploradas sexualmente, desrespeitavam a cultura e os costumes, impuseram uma evangelização forçada”. 
 
Ao som dos atabaques, com músicas que exaltavam a raça negra, as vozes contra o racismo ganharam força na composição “Histórias para ninar gente grande”, cantada ao final da audiência:
 
“Desde 1500 tem mais 
invasão do que descobrimento 
Tem sangue retinto pisado
Atrás do herói emoldurado
Mulheres, Tamoios, Mulatos
Eu quero um país que 
não está no retrato”. 
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