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Insulina em caneta começa a ser distribuída pelo SUS na Bahia.

A princípio, apenas pacientes do tipo 1 terão acesso ao medicamento.

Todos os dias, a aposentada Vivalda Conceição de Aguiar, 67 anos, usa uma seringa para fazer de dois a três furos na região da barriga para injetar dosagens de insulina no organismo.

Com diagnóstico de diabetes há mais de três décadas, ela diz que às vezes a região fica toda dolorida após os furos diários, mas que precisa repetir esse ritual religiosamente para controlar o açúcar no sangue. Ela já ouviu falar da caneta de insulina, que dói menos, mas ainda não conseguiu ter acesso.

É que só agora a insulina análoga rápida em caneta – um tipo moderno, produzido a partir da insulina humana e com ação mais curta – vai ser distribuída gratuitamente para os pacientes diabéticos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Embora a tecnologia já esteja disponível no mercado há pelo menos duas décadas, o primeiro lote de insulina em caneta adquirida pelo Ministério de Saúde (MS) foi encaminhado no mês passado, no embalo da Campanha Novembro Diabetes Azul, para ser distribuída gratuitamente em todos os estados, inclusive a Bahia. Segundo especialistas, um paciente que faz uso regular dessa insulina chega a consumir três canetas por mês. Se tiver que pagar por elas, o custo fixo mensal é de R$ 90.

O Brasil é o quarto país em número de diabéticos. A estimativa é que 425 milhões de pessoas vivam com a doença no mundo, mas só 50% sabe. Dos 50% que têm conhecimento, só metade recebe algum tipo de medicamento. São 14 milhões de diabéticos no Brasil.

Segundo dados do Ministério da Saúde, a doença afeta 5% dos baianos e 6,6% da população de Salvador. Há uma estimativa ainda que, 90% dos pacientes têm o diabetes do tipo 2 e só 10% apresentam o tipo 1, que é quando o pâncreas não produz insulina suficiente para queimar a glicose e é preciso tomar dosagens do hormônio para atender às necessidades do organismo.

Avanços
O anúncio da distribuição da insulina análoga rápida em caneta é considerado um avanço na rede pública. Porém, a portaria do Ministério da Saúde ainda deixa de fora pacientes como dona Vivalda.

É que o documento estabelece que o medicamento vai ser distribuído pelo SUS apenas para quem tem o diabetes tipo 1 e que cumpra alguns pré-requisitos: uso prévio de insulina regular por pelo menos três meses e quadro de hipoglicemia noturna repetida, grave ou não grave repetida nos últimos três meses. A estimativa do MS é que, no país, há pelo menos 400 mil pessoas que se enquadrem nesse perfil. Não há dados por estado.

O primeiro lote enviado para a Bahia tem 2.160 canetas. Segundo informações da Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab), embora a caneta de insulina análoga rápida só comece a chegar agora para os pacientes do SUS no país, na Bahia ela já é uma realidade. Desde 2012 o estado implantou um protocolo para esse fornecimento.

“A Sesab passou a realizar o fornecimento aos pacientes avaliados pelo Cedeba (Centro de Diabetes e Endocrinologia da Bahia) pelos critérios estabelecidos pelo protocolo”, informa. Ainda segundo a pasta, são aproximadamente 2 mil pacientes cadastrados e, por mês, são distribuídas 7.139,4 ampolas de análogos de insulinas em caneta.

A Secretaria Municipal da Saúde de Salvador informa que há 131 Unidades Básicas de Saúde que fazem o atendimento e acompanhamento dos pacientes com Diabetes na capital, além dos Multicentros, Unidades de Urgência e Emergência e o Hospital Municipal de Salvador.

Mais de 22 mil usuários com diabetes estão cadastrados no Sistema de Informação em Saúde da Atenção Básica e recebem o atendimento especializado. No período de janeiro a outubro de 2018, no município foram mais de 27 mil atendimentos realizados.

A advogada Larissa Rosado, que é portadora do tipo 1, e convive com a doença há mais de 30 anos, por exemplo, todos os meses se dirige ao Cedeba para recolher suas canetas de insulina e reconhece os avanços no tratamento do diabetes ao longo das últimas décadas.

“Sou do tempo em que a gente tinha que ferver a seringa para esterilizar, depois botava em uma caixa de metal e transportava em um isopor. A caneta a gente joga na bolsa, na mochila, e aplica em qualquer lugar. Uso até enquanto estou dirigindo”, conta Larissa.

Na avaliação da coordenadora de ações estratégicas do Cedeba, a endocrinologista Odelisa Silva Matos, a caneta é mais prática para o paciente, tem menos riscos de erro de dosagem, é de fácil manuseio para pessoas com alguma deficiência visual – já que emite som enquanto ela é girada -, além de ter uma aplicação menos dolorosa, por ter uma agulha menor.

Primeira-secretária da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), Karla Melo, que participou diretamente da elaboração do dossiê encaminhado ao MS para reivindicar a inclusão da insulina análoga rápida em caneta no SUS defende que as vantagens do medicamento vão além da praticidade do uso para o paciente.

“Tem um efeito mais rápido e dura menos tempo no organismo. No caso da insulina humana regular, o paciente tem que tomar 30 minutos antes das refeições e ela tem um tempo de ação mais prolongada. O alimento chega no organismo, a glicose já aumentou, e a insulina ainda está sendo produzida. Há um descompasso entre a ingestão de alimentos e o tempo de ação da insulina”, explica Karla, que teve o diagnóstico da doença na infância e convive com ela há quatro décadas.

Ainda segundo a representante da SDB, o dossiê mostra que a insulina regular aumenta em 45% a chance de o paciente ter uma hipoglicemia noturna e em 32% o risco de ter uma hipoglicemia grave.  “Era para a insulina rápida ter sido disponibilizada desde o ano passado, ela chega com muito atraso”, avalia.

A expectativa dela é que a distribuição gratuita da caneta melhore a adesão ao tratamento, estimulando que os pacientes passem a aplicar a insulina sempre que for necessário e não mais apenas só quando acharem melhor. “Considero um ganho muito grande para o paciente, que vai ser traduzido em um melhor controle, evitando o risco dele desenvolver complicações”, diz.

Como a insulina rápida age
A insulina do tipo rápida começa a agir com 15 a 30 minutos, cobrindo aquele pico de glicemia que ocorre depois que a pessoa faz uma refeição.

“Toda vez que a gente come, nosso organismo avisa ao pâncreas, que faz uma produção maior de insulina para queimar aquela glicose que a gente comeu”, explica Odelisa. A insulina do tipo rápida age por até quatro horas e deve ser tomada imediatamente antes do momento das refeições.

Cada caneta possui 3 mls de insulina e cada ml tem 100 unidades de insulina. A dosagem que cada pessoa vai consumir depende de quanto ela pesa e da resistência que ela tem à insulina.

Presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia da Bahia, Joaquim Custódio da Silva Júnior explica que, para nortear o uso da insulina rápida, que é feito sempre antes das principais refeições, o usuário deve calcular a quantidade de carboidratos e, a partir daí, definir a dosagem de insulina para impedir que a glicemia suba.

“Se vai comer um pão francês de 30 gramas, por exemplo, a unidade de insulina consegue compensar 15 gramas, então tem que tomar duas unidades de insulina para compensar o pão”, exemplifica.

Ainda segundo Joaquim, a alimentação tem um papel chave no tratamento do diabetes e é necessário que haja um controle tanto do ponto de vista das calorias quanto dos carboidratos, que viram açúcar e aumentam a glicemia mais rápido.

Com informações e foto do Correio.

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